Setembro Amarelo:  Alerta Entre Saúde Mental e Futebol

09/09/2024

O mês de setembro é dedicado à conscientização sobre a prevenção ao suicídio, uma questão global que atinge aproximadamente 800 mil pessoas anualmente, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, a campanha Setembro Amarelo busca aumentar a visibilidade sobre a importância da saúde mental, e o futebol, um dos esportes mais populares do país, começa a adotar práticas para apoiar os atletas em questões emocionais e psicológicas.

O Impacto da Saúde Mental no Futebol

O debate sobre saúde mental no esporte ganhou destaque global durante os Jogos Olímpicos de Tóquio, quando a ginasta Simone Biles decidiu se afastar de quatro finais devido a problemas psicológicos. Sua decisão abriu um importante diálogo sobre a saúde mental dos atletas, mostrando que mesmo os esportistas de elite enfrentam desafios emocionais significativos. Em resposta, a FIFA, em colaboração com a OMS, lançou campanhas focadas em incentivar jogadores, especialmente os jovens, a procurar ajuda quando necessário. Estudos indicam que a metade dos problemas de saúde mental surge na adolescência, reforçando a necessidade de suporte psicológico desde cedo.

O Avanço no Futebol Brasileiro

No futebol brasileiro, a conscientização sobre a importância da saúde mental está crescendo. Júnior Chávare, gerente de futebol do Bahia e com experiência em clubes como São Paulo e Atlético Mineiro, ressalta a importância dos departamentos psicossociais nas categorias de base. Ele acredita que a psicologia, tanto pessoal quanto esportiva, é crucial para o desenvolvimento dos jovens atletas. "Para as instituições que trabalham sério, estes setores são importantíssimos nas categorias de base. Sempre trabalhei fortemente nisso e não tenho dúvida de que é fundamental," afirma.

Apesar desse avanço, problemas de saúde mental não afetam apenas os jovens jogadores. A Federação Internacional de Atletas (FIFPro) revelou que cerca de 23% dos jogadores em atividade enfrentam transtornos do sono, 9% sofrem de depressão e 7% apresentam sintomas de ansiedade. Marcelo Segurado, executivo de futebol, destaca a importância de ter profissionais de psicologia ao lado de preparadores físicos e nutricionistas. "A saúde mental é tão importante de ser promovida, monitorada e tratada quanto a saúde física. Jogadores e treinadores precisam estar fortalecidos mentalmente para desempenhar bem suas funções," explica.

Iniciativas em Clubes Brasileiros

O Fortaleza é um exemplo de clube brasileiro que investe em suporte emocional e psicológico para seus atletas. O clube conta com duas psicólogas, Liana Benício, responsável pela base, e Nara Alciane, que atende o time profissional. Nara Alciane enfatiza a importância de mudar a percepção de que a psicologia é apenas para resolver problemas. "O Fortaleza busca ressignificar a ideia ultrapassada de que a psicologia está ali apenas para trabalhar com o problema. Devemos ser vistos como um agregador no grupo, direcionando nosso trabalho no rendimento, foco, atenção e outras habilidades," afirma.

Marcelo Paz, presidente do Fortaleza, acredita que os Jogos Olímpicos de Tóquio deixaram um legado sobre a importância do cuidado com a saúde mental. "É fundamental ter esse alinhamento entre corpo e mente e contar com profissionais especializados. A psicologia esportiva é um ramo específico e importante para lidar com medos e traumas," conclui.

A Experiência de Nilmar

A experiência pessoal do ex-jogador Nilmar, que enfrentou depressão e ansiedade ao longo de sua carreira, destaca a importância de se falar sobre saúde mental no futebol. Com passagens por clubes como Internacional, Corinthians, e Villarreal, e uma carreira repleta de títulos, Nilmar decidiu se aposentar em 2017 após enfrentar problemas emocionais profundos. "Mesmo com todas as conquistas, não me senti verdadeiramente feliz. Em 2016, no final da minha carreira em Dubai, a tristeza era predominante. A qualidade de vida na cidade não foi suficiente para suprir a falta de energia dos jogos oficiais," revela.

Nilmar também fala sobre a pressão e as expectativas que envolvem a vida de um atleta, e como o suporte psicológico poderia ter feito a diferença. "O retorno ao Brasil e o contrato com o Santos foram um recomeço, mas eu já estava no automático. As pessoas ao meu redor me incentivavam, mas eu sabia que não estava no meu melhor momento."

Psicologia no Futebol Catarinense: Perspectivas e Realidades

A saúde mental dos atletas de futebol em Santa Catarina é uma questão crescente e significativa, refletida na forma como diferentes clubes abordam o suporte psicológico. Os clubes possuem abordagens variadas, dependendo de suas necessidades, recursos e estrutura.

Josielly Pinheiro Westphal, psicóloga do Avaí, destaca uma diferença fundamental entre a psicologia clínica e a psicologia esportiva. "A psicologia clínica geralmente vem com uma demanda espontânea, a pessoa te procura e o foco geralmente é a doença. No esporte, o foco é no rendimento, pensando no bem-estar de forma geral do atleta. O olhar é sobre as relações, detalhes, o clima do grupo, a cultura do grupo, como as pessoas se comunicam e com foco na performance," explica. No Avaí, o trabalho de Josielly é integrado ao da comissão técnica, acompanhando o dia a dia dos atletas entre treinamentos e jogos. Antes da pré-temporada, todos os jogadores passam por uma avaliação individual para entender suas histórias, expectativas e como o mental se comportou em relação a lesões e outras experiências.

Francinéli Becker, psicóloga do Criciúma, reforça que a psicologia do esporte vai além da saúde mental. "Também atua desenvolvendo habilidades da parte mental, como maior nível de confiança, manter-se concentrado por mais tempo e controle emocional de forma geral," afirma. No Criciúma, os trabalhos começaram durante a pré-temporada com avaliações iniciais para ajudar os jogadores a lidarem com suas bagagens pessoais e a se prepararem mentalmente para a temporada.

Atlético Catarinense não possui atualmente um psicólogo, mas o clube tem a intenção de contratar um profissional durante a disputa do Campeonato Catarinense. "Por conta da dificuldade de calendário, boa parte da comissão é temporária," explica o clube.

A Chapecoense possui um psiquiatra parceiro para atendimento e suporte em demandas pontuais, especialmente no Departamento de Futebol Profissional. No entanto, no Departamento de Futebol das categorias de base, o clube conta com uma equipe multidisciplinar que inclui uma psicóloga. A psicóloga da base foi recentemente desligada, mas a vaga será preenchida em breve.

No Hercílio Luz, o psicólogo Jamerson Dornelles realiza um trabalho preventivo com foco em aspectos como frustração e controle emocional, tanto em sessões grupais quanto individuais, de forma quinzenal.

O Joinville não possui um departamento de psicologia atualmente, e Júlio Cesar Nunes, técnico do clube, adota uma abordagem humanizada para lidar com as questões emocionais dos atletas. Ele acredita que, apesar da falta de um psicólogo, a liderança deve oferecer suporte emocional e psicológico.

A variedade de abordagens reflete o reconhecimento crescente da importância da saúde mental no esporte, embora haja diferenças significativas na forma como os clubes em Santa Catarina implementam essas práticas.

Eventos e Iniciativas em Destaque

Como parte das atividades do Setembro Amarelo, o Podcast Momento MP abordará a prevenção ao suicídio e promoverá um evento especial no dia 10 de setembro (terça-feira), a partir das 9h. O evento, organizado pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), discutirá as desigualdades sociais que podem impactar a saúde mental e contribuir para o aumento do risco de suicídio entre diferentes grupos da comunidade, incluindo LGBTQIAPN+, pessoas negras, indígenas, idosas, com deficiência, em situação de rua, e aquelas afetadas por eventos climáticos. Além disso, serão abordadas políticas públicas de prevenção e o cenário da saúde mental em Santa Catarina.

Este evento visa promover um debate crucial sobre como as desigualdades e a falta de acesso a recursos podem afetar a saúde mental e a importância de estratégias eficazes de prevenção. A participação em iniciativas como essas é fundamental para promover um ambiente mais saudável e inclusivo, tanto no esporte quanto na sociedade em geral.

O Setembro Amarelo nos lembra da importância de cuidar da saúde mental e do impacto que isso pode ter em todas as áreas da vida, incluindo o esporte. No futebol, a conscientização e o suporte psicológico estão crescendo, mas ainda há muito a ser feito. Com a colaboração de clubes, psicólogos e entidades esportivas, o futebol pode ajudar a desmistificar a saúde mental e oferecer o suporte necessário para que atletas possam alcançar seu pleno potencial, tanto dentro quanto fora de campo.

Por: Daira Stumer